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A incrível complexidade do que vestimos



No livro O Diabo Veste Prada, de Lauren Weisberger, um dos diálogos mais marcantes é entre um jornalista chamado Nigel e a protagonista. Isto é ainda mais evidente no filme que o livro deu origem. Diz ele, numa tradução livre:

…o que eles criaram é mais que arte, porque nessas criações vivemos nossas vidas..

Ele se refere a alguns estilistas famosos, mas essa frase pode se aplicar à História humana como um todo. Nossas roupas revelam muito mais do que simplesmente a nossa aparência. Elas expressam o engenho humano em todas as suas dimensões: arte, história, ciência e tecnologia.

Na Pré-História, o homem tinha que se adaptar a um ambiente hostil e perigoso. Ele enfrentava predadores, parasitas, chuva e frio, além de ferimentos como cortes, queimaduras e arranhões. Mas ele aprendeu a usar os recursos da natureza para se proteger e se expressar.

Ele tecia ramos, fibras, folhas e vinhas para fazer cestos e tapumes para suas moradias. Observava os animais e as plantas, e aprendeu a domesticá-los e cultivá-las. Desenvolvia o artesanato e a arte com materiais diversos. Possivelmente, ao migrar dentro e fora da África de regiões mais quentes para mais frias, como o norte da Europa, passou a usar as peles dos animais que caçava como agasalho. Assim criou novos hábitos e invenções que garantiram a sobrevivência de uma espécie biologicamente mais fraca que muitas outras que se extinguiram.

A incrível complexidade do que vestimos - Pantera Negra - Blog Farofeiros

Não se sabe ao certo quando inventou-se o fio e o tear, mas essas foram algumas das maiores invenções da Antiguidade. Elas permitiram transformar fibras vegetais e animais em tecidos. Entre as fibras usadas na Pré-História estavam o linho, o algodão, a juta, o bambu, o cairo, a lã. Ele também se encantou com o brilho da seda. Os tecidos possibilitaram a confecção das primeiras roupas com agulhas e ferramentas de corte primitivas. As roupas deixaram de ser apenas uma proteção e passaram a ser também uma forma de expressão artística. A tapeçaria e o vestuário são uma das mais antigas manifestações culturais da Humanidade.

A produção têxtil sempre teve um papel importante no desenvolvimento econômico e social da humanidade. Um dos primeiros avanços nesse setor foi a inserção de velas de pano em embarcações, que permitiu a expansão do comércio marítimo. Um exemplo disso foram as Rotas da Seda, que ligava a Europa e o Norte da África à Ásia Central e o Extremo Oriente, levando principalmente o nobre e brilhante tecido oriental.

A Revolução Industrial foi outro marco histórico na indústria têxtil, pois introduziu teares a vapor que aumentaram a produtividade e a qualidade dos fios e tecidos. Podemos considerar esse período como o início da engenharia têxtil, que busca aprimorar tanto os materiais quanto os métodos de produção, inclusive derivando novos saberes, como a programação.

A partir daí, surgiram novas demandas e oportunidades para os produtores de tecidos e roupas. As criações dos alfaiates passaram a considerar as características específicas do público urbano consumidor que começava a nascer.

Em 1830, o alfaiate francês Bartolomeu Thimonnier inventou a máquina de costura e deu origem à indústria da moda como conhecemos O vestir passou a ter uma função mais prática e menos decorativa, as roupas das elites perderam os excessos de enfeites enquanto as dos trabalhadores ganharam aspectos antes acessíveis somente aos mais abastados.

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No século XX, surgiram novos materiais conversíveis em fibras, principalmente polímeros derivados do petróleo. Dos compostos plásticos nasceram tecidos tecnológicos como nylon, poliéster, elastano e aramida. Até mesmo fibras de vidro, carbono e borracha de látex foram usadas para criar novos tecidos para atender demandas cada vez mais específicas, como confeccionar peças para a prática de esportes e uniformes profissionais. Os novos materiais e métodos industriais reduziram os custos e a produção se profissionalizou de forma impressionante.

Embora a indústria têxtil ofereça muitas oportunidades, ela enfrenta desafios em um mundo globalizado e conectado, abrangendo desde a produção de matérias-primas, distribuição de produtos acabados e laboratórios de pesquisa e desenvolvimento de novos materiais. Além disso, ela gera empregos para diversos profissionais, desde trabalhadores rurais até cientistas e engenheiros.As peças passam a ser conectar à Internet por meio da internet das coisas, incluem sensores inteligentes e outros dispositivos eletrônicos. Porém, os problemas da indústria têxtil são os problemas da economia capitalista de mercado, incluindo o uso de mão de obra análoga à escravidão e a geração de resíduos sólidos.

A produção de fibras têxteis, especialmente as sintéticas, requer grande quantidade de água e energia e produz grandes quantidades de gases de efeito estufa, o que pode ser prejudicial ao meio ambiente. As fibras poliméricas também são bastante duradouras, contribuindo para o acúmulo de lixo no planeta.

Mesmo as fibras naturais, como a lã, exigem grandes áreas de pasto e água, além de gerarem consideráveis quantidades de metano. Portanto, é fundamental que a indústria têxtil adote uma forma mais sustentável de produção, distribuição e consumo, reduzindo os impactos ambientais e sociais do setor.

Quer saber mais de indústria 4.0? Já conversamos sobre ela aqui:

A verve criativa dos designers da chamada alta-costura se mostra o lado mais vibrante e mostram a vanguarda da indústria têxtil, que encanta as passarelas e as páginas das revistas de moda. Mas, por fim, o segmento precisa ainda equilibrar o engenho criador com a padronização dos mercados, a valorização das identidades locais e tradicionais, busca por personalização e a segmentação em “tribos” da sociedade moderna.

As roupas estão presentes na uniformidade de vestes dos grupos de operários e estudantes, bem como no uso de nossos jeans e camisetas cotidianos, modelos desfilando peças conceituais de alta-costura ou sendo queimadas nos protestos pelas liberdades individuais. O vestir nos séculos XX e XXI tornou -se, também, um ato político.

Acompanham no perigo os pilotos de Fórmula 1 em seus macacões antichamas e os alpinistas em seus agasalhos protetores. As roupas também vão à guerra com soldados e suas fardas, ao fundo do mar com os escafandros dos mergulhadores e chegam ao espaço sideral com os astronautas nos seus trajes especiais.

Se num primeiro momento as vestimentas foram uma resposta criativa à necessidade de sobreviver. Depois a relação entre as pessoas e suas roupas passou a ser muito mais ampla e complexa que apenas proteger e aquecer.

De forma quase sempre imperceptível, essa relação nos acompanha em todos os momentos de suas vidas, sendo quase um elo de ligação entre as mais diferentes pessoas. São importante elo de comum. Desde os primórdios da civilização, essa relação se mistura com a evolução da sociedade humana de tal forma que não é possível separar uma da outra sem que se desfaçam como no ato de puxar um fio numa malha de tricô…

Por Alessandro F. Rodrigues

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