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Saneamento básico JÁ!

O caso das “influenciadoras” que viralizaram nas redes entregando uma pelúcia de macaco e de banana a crianças negras revoltou muitos que viram essas cenas lamentáveis e criminosas. Na semana passada, um “jogo” que simulava escravidão também viralizou pelo mesmo motivo. Na semana anterior, Vini Jr. sofreu mais um episódio de racismo dentro de campo na Espanha durante um jogo. O racismo permanece enraizado na cultura mundial e está longe de ser extinguido, a não ser que medidas ainda mais enérgicas sejam tomadas pelas autoridades, seja no que diz respeito à punição dos criminosos, ou em políticas públicas de educação e letramento racial desde a primeira infância.

Mas o que eu quero tratar nesse artigo é a incessante busca por seguidores, likes e cliques que estão transformando, ou apenas revelando, o grande esgoto virtual em que nos metemos nos últimos anos e a quantidade de bosta seca boiando dentro dessa grande privada que se tornaram as redes sociais nos últimos anos. E já adianto, grande parte da culpa dessa proliferação de coliformes fecais sob a alcunha de “influenciadores” se deve, principalmente, a indústria audiovisual e de publicidade, onde números são mais importantes do que responsabilidade social, qualidade e, acima de tudo, talento.

Eu falo sem medo e por experiência própria que grande parte da culpa desse esgoto estar transbordando vem do audiovisual, devido a importância que ela dá aos números nas redes sociais, e não faltam exemplos. Eu já perdi trabalhos por não ter números no meu Instagram, ou por não expor meu corpo, ou os atributos que Deus me deu em uma cueca semitransparente no meu Instagram, por exemplo. Coisa da minha cabeça? Não, não, eu ouvi de uma produtora de elenco que eu precisava “malhar um pouco mais e mostrar o que eu tinha para oferecer visualmente”. Dá pra acreditar? Mas é a mais pura verdade, e é por isso que você viu diversos atores durante a pandemia, e muitos depois dela, caindo nas trends de dancinhas e videos engraçadinhos, porque precisavam manter sua relevância, ou perderiam espaços pros novos “sucessos” embalados pelo “Tubarão, Tchi Amu!”.

Tudo bem, você vai achar que eu não sou um bom exemplo, mas eu trago provas, beu abor:

Elle Fanning perdeu papel em grande franquia por ter “poucos” seguidores na época. A atriz de Malévola, Super 8, Mary Shelley e irmã de Dakota Fanning não foi considerada. Hoje, ela tem 6,2 milhões de seguidores no Instagram. As atrizes brasileiras Natália Rodrigues e Simone Gutierrez também perderam papeis por não serem “influenciadoras” digitais. Alice Braga, conhecida tanto no Brasil quanto no exterior, deu uma entrevista em 2021 à Trip FM, e comentou: “Começaram a pedir número de seguidores em teste de elenco. Isso é um absurdo; não deveria ser medida para nada”, reclamou Alice. “Como vamos empregar pessoas incríveis que são desconhecidas?”, questionou a atriz.

Trabalhei em uma agência de atores e modelos, então, eu tenho total conhecimento de que o mercado audiovisual brasileiro é um dos grandes culpados por dar força a esses seres abjetos. Seguidores garantem publicidade gratuita do projeto, simples, basta fazer as contas. Digamos que eu tenha uma base sólida de seguidores nas minhas redes e sou chamado para um trabalho grande na TV ou no streaming, é claro que eu vou publicar, porque quero compartilhar onde cheguei com meus queridos followers. Pronto, propaganda gratuita e que vai aumentar o hype naquele trabalho, gerar um buzz, possíveis matérias nos veículos de imprensa e, consequentemente, um acompanhamento mais de perto para avaliar a minha performance naquele produto. Isso tudo sem a produção precisar desembolsar um único tostão para pagar pela publi.

Saneamento básico já - Thii Gouveia - Blog Farofeiros

E, de novo, a gente volta pra mesma questão: até quanto atores e criadores de conteúdo que produzem conteúdos de qualidade, com responsabilidade social, atores e atrizes, me incluo nessa, que têm talento, estudo e dedicação constante ficarão invisíveis pelo algoritmo, pelo mercado e até por pessoas próximas que preferem um conteúdo violento, sexualmente apelativo, sensacionalista e, muitas vezes, criminoso? 

Eu não tenho resposta para essa pergunta, mas eu sei que a mudança começa com o conteúdo que você consome e quem você apoia. Para nós, criadores de conteúdo no geral, trabalhadores das Artes, ou a gente entra no shape e capricha na roupa íntima, ou continuaremos a ver toletinhos ocupando espaços e ganhando milhões enquanto nos afogamos nas merdas das nossas frustrações.

Volto a qualquer momento com mais um desabafo de raiva. E olha que fui bem resumido. Parabéns pro geminiano. Ah, aproveita e me segue no Instagram pra ver se a Globo me nota de novo, preciso de dinheiro.

Por Thii Gouveia

Se você acha meu Twitter confuso, precisa ver minha vida. Farofeiro do
Farofeiros Cast.

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